quinta-feira, 16 de abril de 2015

Literatura: Dead Kennedys e Ramones

“Dead Kennedys - Fresh Fruit For Rotting Vegetables (os primeiros anos)” já escancara logo no título as intenções. Escrito pelo jornalista Alex Ogg e com tradução de Alexandre Saldanha tem 240 páginas e lançamento nacional no ano passado pela Edições Ideal (que faz um ótimo trabalho no mercado editorial brasileiro com publicações relacionadas a música). No livro é apresentado o início da carreira de uma das bandas mais poderosas do punk. Desde a formação as páginas avançam até pouco tempo depois do lançamento de estreia em 1980 (que empresta o nome ao título), antes da separação em 1986 (esqueça a banda depois disso nas novas formações) e de todos os problemas que levaram a crise, principalmente a briga por direitos autorais e méritos de criação entre o vocalista Jello Biafra, o guitarrista East Baty Ray e o baixista Klaus Flouride. O álbum que trouxe canções do porte de “Kill The Poor”, “California Über Alles”, “In The Head” e “Holiday in Cambodia”, evidentemente é o foco mostrando tanto fatos sobre a elaboração e gravação, como também indo além para narrar todo o rebuliço e importância da obra. O livro conta com várias fotos do acervo do guitarrista e de ilustrações de Winston Smith, que entrecortam o texto de Alex Ogg baseado nas entrevistas que fez com os integrantes do grupo. Leitura completamente indicada para fãs do disco e da música possante contida nele.

Nota: 7,0

P.S: A editora disponibiliza algumas páginas para leitura gratuita, aqui.

“Na Estrada com os Ramones” foi lançado originalmente em 2003 lá fora. Escrito pelo gerente de turnê da banda, Monte A. Melnick, em parceria com o jornalista Frank Meyer ganhou edição nacional em 2013 através da Edições Ideal (sempre ela) com tradução de Alexandre Saldanha e 264 páginas de muita informação. Informação não muito nova para quem leu alguma das autobiografias de integrantes do grupo ou de outras diversas relacionadas ao quarteto mais famoso do punk rock, é verdade, mas ainda assim bem prazerosa. Até porque apresenta uma visão um pouco diferente, pois é vista mais de fora por alguém que estava lá desde o início e se fez presente nos 2.263 shows feitos (todos relacionados em um índice no livro) entre 30 de março de 1974 e 6 de agosto de 1996, quando as atividades musicais foram encerradas, enquanto o mito só faz aumentar cada vez mais. Das gravações primordiais até o fatídico e anunciado final, o leitor pode conhecer um pouco mais sobre a dificuldade de convívio entre os integrantes, a constante briga por domínio territorial, o uso demasiado de drogas e álcool e o profissionalismo absurdo com que tudo foi tocado apesar de todas essas questões, o que chega a impressionar. Leitura plenamente válida. 

Nota: 7,0

P.S: A editora disponibiliza algumas páginas para leitura gratuita, aqui.

terça-feira, 7 de abril de 2015

" A Hora dos Ruminantes" - José J. Veiga

É um dia como qualquer outro. Os afazeres são feitos calmamente com dedicação e parcimônia. Tudo parece igual como sempre foi em uma pacata vila interiorana dos anos 60. Ao longe ouvem-se cantos de pássaros e ruídos de animais. Até que ao acordar no dia seguinte os habitantes enxergam um acampamento cheio e organizado no outro lado do rio, conectado por uma pequena ponte. De súbito, a rotina vai para o espaço, pois a curiosidade toma conta de todos que procuram saber quem se aventura por terras tão remotas e quais são seus objetivos.

“A Hora dos Ruminantes”, livro escrito pelo goiano radicado no Rio de Janeiro José J. Veiga e publicado pela primeira vez em 1966 tem como ponto de partida o descrito no parágrafo anterior. É o segundo livro do autor e sucede “Os Cavalinhos de Platipanto” de 1959 com seus 12 contos que fazem intersecção entre sonho e realidade. Os dois livros estão sendo republicados esse ano pela Companhia das Letras em comemoração ao centenário de nascimento do autor (que faleceu em 1999) e os demais trabalhos concebidos por ele também estão programados para sair.

Essa nova edição de “A Hora dos Ruminantes” ganha um bocado de capricho com direito a prefácio detalhado, índice de obras relacionadas e capa dura. Com 152 páginas demonstra ao novo leitor o realismo fantástico de José J. Veiga que ganha paralelo na obra de autores sul-americanos como Gabriel Garcia Márquez, Julio Cortázar, Arturo Uslar Pietri e Murilo Rubião. É um texto onde as alegorias e metáforas tomam conta do cenário, mas sem deixar de lado a parte coloquial da fala dos habitantes e, por conseguinte, a montagem de um retrato do interior do Brasil.

O livro é dividido em três partes: “A Chegada”, “O Dia dos Cachorros” e “O Dia dos Bois”. Na primeira, como já retratado acima, a vila de Manarairema se depara com estranhos que chegam do nada e não se apresentam nem para conversar. O estranhamento inicial faz contrapartida com o medo que o ser humano tem da mudança, da alteração da rotina, do novo. Mas ainda mais fundo está a analogia e a relação com a ditadura militar em voga no país na época, podendo partir do pressuposto que os novos moradores do local são “gente do governo”, como diz o texto.

Com o medo se espalhando entre os simples moradores que passam a sofrer pequenas, mas frequentes coerções, a vila de Manarairema sofre drásticos ajustes. Isso só piora quando cães tomam de assalto o local obrigando todos a ficarem ressabiados e com pânico do que poderá vir, ou depois quando são bois que adentram esse espaço e não permitem nem que se saia de casa, precisando ser inventando todo um novo meio de comunicação para que a cidade sobreviva em meio a esses acontecimentos estranhos e tão sem sentido para o povo da vila.

No meio dos diálogos José J. Veiga insere bom humor ao lado do espanto, com a inserção de diversos ditados populares, mas também é no meio desses diálogos que amplifica as imagens alegóricas que fazem menção a verdadeira invasão que tomou conta do país naqueles tempos. Por outro lado, “A Hora dos Ruminantes” é um livro tão bem construído que funciona até se o leitor relevar isso e considerar as situações somente pelo viés da estranheza e da opressão que os habitantes de Manarairema se encontram adicionados. São essas possibilidades que constroem o maior mérito da obra.

Nota: 9,0

A Companhia das Letras disponibiliza gratuitamente um trecho para leitura, aqui.

Assista um vídeo com Antonio Arnoni Prado (responsável pelo prefácio do livro) falando mais sobre a obra do autor:

domingo, 5 de abril de 2015

"Dois Irmãos" - Fábio Moon e Gabriel Bá

O escritor manauara Milton Hatoum nasceu em 1952. Em 2000 lançou o romance “Dois Irmãos” ambientando em Manaus que conta a história dos gêmeos Omar e Yaqub, filhos de pais com origem libanesa. O livro é um romance denso que narra um drama familiar de proporções amplas, um pequeno épico da literatura nacional. O diretor Luiz Fernando Carvalho finaliza uma minissérie sobre a obra para estrear esse ano na Rede Globo, com nomes como Juliana Paes e Antônio Fagundes no elenco, porém, antes disso “Dois Irmãos” chega às livrarias em formato de graphic novel.

Os irmãos (e também gêmeos) paulistas Fábio Moon e Gabriel Bá trabalharam por quatro anos na adaptação para os quadrinhos. Essa adaptação foi lançada recentemente pela Companhia das Letras, dentro do selo Quadrinhos na Cia., com 232 páginas, formato grande (18 x 24,5cm) e em preto e branco. A talentosa dupla já havia se aventurado na conversão literária com “O Alienista” de Machado de Assis, mas foi em trabalhos originais que exibiram sua vocação com maior classe, como atesta a admirável “Daytripper”, premiada edição 
lançada por aqui em 2011.

Ao recontar a história concebida por Hatoum, Fábio Moon e Gabriel Bá adicionam a mesma intensidade e fineza já demonstradas antes e cravam outro acerto na carreira, que não só honra a obra homenageada, como também agrega novo valor a esta, o que não é muito comum nesses casos. A trama se inicia na Manaus de antes da Segunda Guerra Mundial, nos anos 30, quando os gêmeos Omar e Yaqub brigam entre si com grave resultado e os pais decidem mandar um dos dois para o Líbano para que feridas sejam curadas. O retorno só ocorre depois da guerra e não surte o efeito esperado.

Omar e Yakub tem a própria guerra para travar e no meio dela inserem a mãe Zana, o pai Halim e a irmã Rânia, além de Domingas e o filho, criados na casa com eles. Cada personagem é confeccionado com cuidado redobrado e nenhum é repleto de bondades ou pode ser considerado como um herói. Da malandragem de Omar até a inteligência de Yakub, expõe-se os desejos extremamente protetores da mãe e a raiva contida do pai pelos filhos. Até a doce irmã Rânia que em deliberado momento se apresenta como suporte para a família, também tem segredos e desejos reprimidos.

“Dois Irmãos” terá lançamento no mercado norte-americano e europeu e é uma oportunidade para alavancar ainda mais a carreira dos envolvidos, tendo em vista o zeloso trabalho realizado. Com uma arte de planos abertos, traços límpidos e quadros sem conversa apresenta uma Manaus repleta de vida e de oportunidades, mas ainda sim escorada nos males de toda cidade. Carregada de ambiguidade e tons cinzentos, Fábio Moon e Gabriel Bá se apropriam com autoridade do texto de Milton Hatoum e demonstram que famílias são infelizes cada uma a sua maneira em todo tempo e lugar.

Nota: 8,5

A Companhia das Letras disponibilizou um trecho para leitura, aqui.

Textos relacionados no blog:
- Quadrinhos: “Daytripper” – Fábio Moon e Gabriel Bá

Assista a um vídeo sobre a obra:


quinta-feira, 2 de abril de 2015

"Marvel Comics - A História Secreta" - Sean Howe

Em novembro de 1961 “The Fantastic Four No. 1” era lançada nos Estados Unidos a US$ 0,10. Escrita por Stan Lee e desenhada por Jack Kirby ali se iniciava para valer o Universo Marvel como conhecemos, mesmo que os autores não imaginassem naquele momento quanto suas criações iriam valer e a quantidade de pessoas que iriam atingir. O Quarteto Fantástico foi imaginado como uma resposta para a Liga da Justiça da América da DC Comics, feito sobre as ordens de Martin Goodman, dono da Magazine Management Company, que depois viria se tornar a poderosa Marvel, desde 2009 parte do império Disney e com receitas anuais absurdas.

“Marvel Comics – A História Secreta” (Marvel Comics: the untold story, 2012) narra a história da criação desse colosso do entretenimento desde os anos 30 ainda com outro nome até a já citada venda de 2009. Com lançamento nacional pela Editora Leya em 2013 conta com 560 páginas e um apêndice exclusivo elaborado pelo tradutor da obra Érico Assis relacionando cada história citada com a publicação no país. O autor Sean Howe viaja pelas décadas para contar uma jornada permeada por brigas, desilusões, traições, egoísmo, sorte e, acima de tudo, muita, muita criatividade.

A viagem proposta pelo autor tem a Marvel como foco mas também serve como panorama da indústria dos quadrinhos durante os anos, além de correlacionar outras editoras como DC Comics, Dark Horse e Image Comics como coadjuvantes de luxo. Tem como grande mérito amarrar a criação de personagens clássicos como Homem-Aranha, Capitão América, Thor, X-Men, Quarteto Fantástico, Homem-de-Ferro e Hulk (entre tantos outros) com as decisões editoriais e empresariais por trás de tudo, construindo assim um estudo de caso detalhado sobre normas de mercado e gestão de marcas, relatando todos os atropelos criados pela própria empresa.

“Marvel Comics – A História Secreta” é recheado de casos engraçados e diversos outros de pura picuinha e maldade corporativa. Tem como pano de fundo a briga eterna pela autoria dos personagens, a remuneração por parte do lucro gerado por essas criações e as conquistas que foram alcançadas a passos lentos nessa questão. Apresenta um Stan Lee sem máscara e dotado por uma paixão imensurável pelos quadrinhos, mas que tomou decisões cruéis ou pecou pela omissão em vários momentos, além de focar desde cedo na transposição das obras para o cinema, uma obsessão cega que mostrou acertadamente ser o caminho da salvação.

O grande Jack Kirby é retratado como vítima ao mesmo tempo que tem declarações contestadas pela veracidade dos fatos (como ele ter criado sozinho o Homem-Aranha). Outros artistas importantes como Steve Ditko, Chris Claremont, Neal Adams, Frank Miller e Todd McFarlane são misturados a editores, empresários e milionários em meio a discussões fortes, pedidos de demissões e desilusão com o mercado. Jim Shooter, por exemplo, o manda chuva que salvou a Marvel nos anos 70 mas logo em seguida a afundou em um processo de falta de criatividade, censura e bagunça administrativa que culminaria no pedido de falência dos anos 90, transita por esses dois lados.  

“Marvel Comics – A História Secreta” é daqueles livros que pode tranquilamente carregar o status de imprescindível. É um trabalho robusto gerado em anos de pesquisas e centenas de entrevistas e por mais que não dê tanta atenção aos anos mais recentes da empresa, ainda assim apresenta material para inacabáveis análises e discussões futuras. Há de se considerar também que é um livro de jornalista e não a história oficial da empresa. Essa história foi lançada ano passado lá fora (“75 years of Marvel Comics”), um calhamaço de 700 páginas escrita pelo ícone Roy Thomas, ainda sem edição nacional.

Contudo, uma coisa é certa, depois de acabar o livro de Sean Howe, você nunca mais lerá quadrinhos da mesma maneira. Não mesmo.

Nota: 9,5

Site oficial do autor: http://seanhowe.com

Textos relacionados no blog:
- Literatura: “Will Eisner: Um Sonhador nos Quadrinhos” – Michael Schumacher

A Editora Leya disponibilizou um trecho para leitura. Veja abaixo:

terça-feira, 31 de março de 2015

"Mapas Para As Estrelas" - 2015

Uma jovem chega a Hollywood e a primeira coisa que faz é encomendar uma limusine para circular pela cidade atrás de casas de famosos e celebridades. Repassa um endereço específico ao motorista e vai conversando sobre esse tema o que leva o telespectador a crer nesse momento que se trata de mais uma deslumbrada com o mundo da fama. Só que essa impressão é descartada quando chegam ao endereço e lá não tem nada, só um grande espaço vazio. A partir disso começa uma história onde o buraco é muito mais embaixo.

A jovem se chama Agatha Weiss (Mia Wasikowska de “Alice no País das Maravilhas”) e mantém relação com uma família famosa composta por um arrogante ator adolescente (Evan Bird), a dedicada e conturbada mãe (Olivia Williams) e o pragmático pai (John Cusack) que tem horário na tevê e explora técnicas de autoajuda como fonte de rendimentos. Para fechar o ciclo temos uma atriz decadente (interpretada brilhantemente por Juliane Moore) para quem Agatha vai trabalhar, e o motorista da limousine com quem ela inicia um relacionamento (Robert Pattinson).

Esse é o mote de “Mapas Para as Estrelas” (Maps to The Stars, originalmente), o novo filme do diretor canadense David Cronenberg lançado lá fora no ano passado e com estreia recente aqui no Brasil. Na superfície o roteiro de Bruce Wagner (“Luta de Classes em Beverly Hills”) trata de um drama familiar e pessoal, mas é só passar um pouquinho da primeira camada para invadir um mundo sujo, frágil e com relações construídas por puro interesse, afinal é um filme de Cronenberg e se uma coisa que o seu cinema faz com maestria desde “Scanners” de 1981 é gerar incômodo.

“Mapas Para as Estrelas” sucede o ótimo “Cosmópolis” de 2012 (onde Robert Pattinson também estava em uma limusine), mas avança um pouco mais na experimentação e trabalha uma trama de desajuste social, pressão psicológica e esvaecimento profissional, junto com incesto, drogas, abusos sexuais e violência. Como sempre, Cronenberg faz ótimo trabalho com os atores que escolhe. Juliane Moore está excelente como a atriz saturada Havana Segrand, assim como John Cusack como o Dr. Stafford Weiss e Mia Wasikowska em um papel onde a dubiedade é a grande sacada.

“Mapas Para as Estrelas”, porém, traz um problema embutido no exagero de algumas situações. Mesmo que se perceba esse exagero como necessário para expor uma Hollywood doentia e superficial, ainda assim a carga é demasiada, principalmente quando são inseridas visões de pessoas mortas com frequência em mais de um personagem. No mais, ainda assim é um trabalho que instiga o telespectador a sair um pouco do habitual e só por isso já vale a pena ser visto, além do que, um filme mais ou menos de David Cronenberg vale mais do que a maioria do que temos hoje por aí.

P.S: O filme rendeu o prêmio de Melhor Atriz para Juliane Moore no Festival de Cannes e uma indicação de Melhor Diretor para David Cronenberg no mesmo festival.

Nota: 7,0

Textos relacionados no blog:

- Cinema: “Cosmópolis” - 2012

Assista a um trailer legendado:


sexta-feira, 27 de março de 2015

"Sniper Americano" - Chris Kyle

“Não arrisquei a vida para levar a democracia ao Iraque. Arrisquei-a pelos meus companheiros, para proteger os meus amigos e compatriotas. Fui à guerra pelo meu país, não pelo Iraque. Meu país me mandou lá para que aquela merda não fosse parar na nossa terra. Nunca lutei uma única vez pelos iraquianos. Eu estava pouco me fodendo para eles”.

Durante a guerra do Iraque nos anos 2000 que foi vestida com as roupas daquilo que os EUA denominaram de “Guerra ao Terror” depois do atentado de 11 de setembro de 2001, muito se ouviu sobre as verdadeiras causas da invasão, sobre os reais motivos que levaram o Presidente Bush e sua cúpula a ordenar os ataques. Durante esse tempo revelações foram feitas e percebeu-se que alavancada por inúmeras mentiras os motivos dos EUA não eram tão nobres como eles alegavam e pouco tinham a ver com levar a liberdade ao povo iraquiano acuado pelo sanguinário ditador Saddam Hussein.

O texto realçado lá em cima é retirado do livro “Sniper Americano” (“American Sniper: The Autobiography of the Most Lethal Sniper in U.S Military History” no original, 2013), que a editora Intrínseca publicou no Brasil no início desse ano pegando carona no filme dirigido por Clint Eastwood e estrelado por Bradley Cooper, que rendeu surpreendentes e inexplicáveis 6 indicações ao Oscar, incluindo ali categorias como Melhor Filme, Melhor Ator e Melhor Roteiro Adaptado. Se ao sair do cinema questionava-se como um trabalho tão ruim poderia ter sido agraciado com tantas indicações, depois de acabar o livro que deu origem ao longa se conclui que nada é tão ruim que não possa piorar mais.

O livro de Chris Kyle elaborado com a ajuda do escritor Jim DeFelice e do advogado (sim, advogado) Scott McEwen ganhou o subtítulo nacional “O Atirador Mais Letal da História dos EUA”, realçando o fato de que mais de 150 mortes foram atribuídas ao autor e outras mais ainda anseiam por confirmação. Com 344 páginas e tradução de André Gordirro, o livro apresenta esse SEAL (membro de força específica da Marinha treinada para operações especiais), nascido no Texas e falecido aos 39 anos, assassinado por outro veterano de guerra que sofria de estresse pós-traumático e estava dentro do rol de pessoas ajudadas em um projeto destinado a reinclusão de soldados na sociedade.

Desde criança Chris Kyle já tinha acesso a armas de fogo, coisa normal dentro da cultura do seu país. Quando resolveu entrar para a Marinha com o senso de patriotismo exacerbado se direcionou para o grupo de atiradores de elite, onde essa paixão armamentista poderia ser bem utilizada. Lá ele encontrou um ambiente propício para progredir e utilizar suas ideias de mundo a favor de Deus, da pátria e da família, nessa ordem, como faz questão de destacar em várias passagens. E foi premiado por isso e exaltado pelos seus feitos, suas mortes, mesmo que isso não lhe interessasse tanto no que chamava de “glória de mentira”, pois o objetivo era mesmo matar pessoas.

Quando descreve o treinamento para chegar a SEAL, onde sofria todo tipo de violência física e psicológica para ficar quase indestrutível, é fácil perceber como a máquina de guerra funciona superficialmente. Os soldados passam por uma lobotomia onde todo o senso de questionamento é retirado para seguir ordens. A enfermeira britânica Florence Nightingale, pioneira do tratamento a feridos de guerra, afirmou certa vez que: “é necessária uma certa dose de estupidez para se fazer um bom soldado”. Durante a leitura de “Sniper Americano” essa frase se correlaciona em vários momentos e em diversas formas.

A figura de Chris Kyle, pelo menos aquela retratada no livro, é egocêntrica e raivosa, com claros exemplos de racismo e xenofobia, além de desprezo para quem não pensa da mesma maneira que ele. Visões de valores deturpados pelo meio ou o senso de que todas as mortes são abonadas por algo superior e ele pode “ficar diante de Deus com a consciência limpa por ter feito o (...) trabalho”, mostram que o seu fundamentalismo religioso não é tão diferente assim daquele que visava combater. Por dentro desse discurso de pátria e religião o que reside mesmo é a diversão, que o autor afirma frequentemente conseguir, dizendo que “adorava o que fazia”.

Não há ingenuidade na guerra e nela não existem santos. Barbaridades são cometidas dos dois lados envolvidos, por isso toda crucificação pode ser uma bela furada. No entanto, “Sniper Americano”, além da escrita sem brilho, mostra um protagonista com ideário questionável e senso de justiça completamente difuso. É um livro que vale somente para atestar o absurdo doutrinamento utilizado para se formar soldados eficazes e com pouca argumentação destinados a atingir fins governamentais escusos travestidos de bondade, sendo que o enaltecimento dos feitos de guerra pelo governo e pelo próprio livro construindo uma lenda ou mito faz parte direta disso.

P.S: Mestre Yoda, que sabia muito das coisas, afirmava brilhantemente em Star Wars:“Grande guerreiro? Guerra não faz grande ninguém”É por aí.

Nota: 3,0

A editora Intrínseca fez uma página para o livro. Para saber mais, acesse: http://www.intrinseca.com.br/sniperamericano 

domingo, 22 de março de 2015

Quadrinhos: "Cidade Selvagem - Vol. 1" e "Batman: Noel"

“Cidade Selvagem – Volume 1” (Fell, no original) é ambientada em uma zona urbana detestável que usa como acesso uma simbólica ponte. Nesta terra sem regras, a criminalidade e a falta de punição por parte da lei alcançam níveis estratosféricos. É nessa pequena parte do inferno que o Detetive Fell está inserido quando opta (por motivos silenciosos) em trabalhar na  delegacia da região que possui apenas “três detetives e meio” disponíveis. Publicada originalmente pela Image Comics em 9 edições entre setembro de 2005 e janeiro de 2008, a série ganha nova publicação nacional pela Mythos Books agora no início de 2015, com 164 páginas dispostas em uma bonita edição encadernada (como é costume da editora). Escrita por Warren Ellis (“Transmetropolitan”) e com arte de Ben Templesmith (“30 Dias de Noite”) temos uma história bem ao estilo do seu criador, com personagens que sempre deixam alguma coisa para ser descoberta e vivem na margem entre o certo e o errado sem se importar muito com isso. Contando com arcos fechados dentro de cada edição como nos seriados criminais famosos da televisão, acaba por funcionar bem, devido também a carga de humor negro embutida. Todavia, o grande destaque é a arte de Templesmith que surge riscada, escura, desfocada e com alguma referência a Frank Miller inserida ali no meio. Mesmo com um sentimento geral de não finalização já que a edição número 10 ainda não foi lançada lá fora (de 16 previstas), “Cidade Selvagem – Volume 1” se configura em uma boa história de quadrinhos.

Nota: 7,0

“Um Conto de Natal” de Charles Dickens já ganhou incontáveis adaptações desde 1843, seja na televisão, teatro, cinema ou literatura. A história do endurecido Scrooge que recebe a visita de três fantasmas no natal (representando o passado, presente e futuro) para que, entre outras coisas, analise o caminho que a vida dele tomou, praticamente já foi exaurida por completo. Eis que em 2011 o artista Lee Bermejo (da fenomenal “Coringa” ao lado de Brian Azzarello) resolveu utilizar novamente essa narrativa e desta vez correlacionar com o Batman. Sim, o Batman. O resultado disso tinha tudo para ser um imenso lago de sentimentalismos e clichês, mas, para grata surpresa, as coisas não saíram tão banais assim. “Batman: Noel” que a Panini Comics lançou por aqui no final do ano passado com 112 páginas, papel couchê e capa dura, com roteiro e arte de Lee Bermejo e cores de Barbara Ciardo é uma história que merece estar no rol das melhores coisas feitas com o morcego nos últimos anos. Transformando Batman em Scrooge, o autor mostra um herói raivoso que há muito tempo deixou de lado a nobreza e entrou em uma caçada cega contra o mal, desvirtuando assim seus princípios e ações. Quando começa a perseguir um dos capangas do Coringa no Natal ele recebe a visita dos três “fantasmas”, aqui travestidos de Robin, Mulher-Gato e Superman e a jornada de redenção é construída. “Batman: Noel” apresenta uma arte rica e exuberante, além de um roteiro que usa a obviedade como força para edificar uma história com significados e emoções.

Nota: 9,0

Textos relacionados no blog:
- Literatura: “Máquina de Armas” – Warren Ellis
- Quadrinhos: “Coringa” – Brian Azzarello e Lee Bermejo


quarta-feira, 18 de março de 2015

Música: Belle and Sebastian e Idlewild

Prestes a completar 20 anos de existência o Belle and Sebastian lança o nono disco da carreira. “Girls in Peacetime Want to Dance” saiu em janeiro pela Matador Recors e conta com 12 faixas produzidas por Ben H. Allen III (Animal Collective, Gnarls Barkley) e masterizadas pelo velho conhecido Frank Arkwright. Com lançamento em vários formatos traz além das canções originais alguns bônus, como na versão japonesa que conta com 4 acréscimos (entre elas a boa “A Politician’s Silence”). O sucessor de “Write About Love” de 2010 mostra os escoceses encabeçados por Stuart Murdoch levando sua música em direção mais dançante que o habitual, com muitos teclados, sintetizadores e ecos do pop eletrônico dos anos 80, do Pet Shop Boys e da disco music. Nesse sentido temos acertos na abertura com “Nobody’s Empire”, em “Perfect Couples” e em “Play For Today”, ótimo dueto com Dee Dee Penny da Dum Dum Girls. O Belle Sebastian de antes dá as caras aqui e acolá como em “Allie” e na esperançosa “Ever Had A Little Faith”, uma das melhores faixas do trabalho. Com “Girls in Peacetime Want to Dance” o Belle and Sebastian demonstra não estar acomodado com as fórmulas de sempre, muda um pouco, insere músicas mais longas e avança artisticamente nesse ponto, por mais que o disco não seja um primor completo como atestam as faixas “The Party Line”, “The Cat With The Cream” e “Enter Sylvia Plat”.

Melhor faixa: "Ever Had A Little Faith"

Nota: 6,0

Facebook: http://www.facebook.com/belleandsebastian 

O grupo escocês Idlewild não lançava nada desde 2009 com “Post Electric Blues”. Nesse intervalo os líderes se aventuraram em carreira solo e conseguiram bons frutos tanto com Roddy Woomble que lançou dois estupendos trabalhos (“The Impossible Song & Other Songs” de 2011 e “Listen To Keep” de 2013) quanto com Rod Jones (“A Sentimental Education” de 2010). A ausência chegou ao fim no início desse ano com “Everything Ever Written”, álbum de 12 faixas gravado em vários estúdios e lançado pela gravadora Empy Words com produção do guitarrista Rod Jones e masterização de Steve Fallone. Os cabeças do Idlewild junto ao baixista Andrew Mitchell e o baterista Colin Nweton, além do novato tecladista Luciano Rossi, trazem o trabalho individual, predominantemente acústico, para esse sétimo registro. Esse lado sempre esteve escondido no meio da urgência de discos como “The Remote Part” de 2002 ou “Make Another World” de 2007, mas agora aparece com mais afinco e auxílio de piano, cello, trompete, saxofone, órgão e o altivo violino de Hanna Fischer que também ajuda nos vocais. Não que as guitarras tenha sumido, marcam presença em “Collect Yourself”, “Come On Ghost” e principalmente em “On Another Planet”, além dos impecáveis 7 minutos de “(Use It) If You Can Use It”, porém, isso se equilibra bem com o lado mais calmo visto nas faixas “Every Little Means Trust”, “So Many Things To Decide”, “Like A Clown” e “Utopia”. Em “Everything Ever Written”, o Idlewild continua sendo uma banda que você sempre pode acreditar, não só pelas canções, mas também pelas letras e postura. O novo disco é mais um forte exemplo disso.

Melhor faixa: "(Use It) If You Can Use It"

Nota: 9,0

Site oficial: http://idlewild.co.uk

Textos relacionados no blog:
- Música: “Write About Love” (2010) – Belle and Sebastian
- Música: “A Sentimental Education” (2010) – Rod Jones
- Música: “The Impossible Song & Other Songs” (2011) – Roddy Woomble
- Música: “Listen to Keep” (2013) – Roddy Woomble

Assista ao clipe de "The Party Line" do Belle and Sebastian e uma versão acústica ao vivo do Idlewild para “Every Little Means Trust”:



domingo, 15 de março de 2015

Quadrinhos: "Batman: Arquivo de Casos Inexplicáveis" e "Kirby: Genesis"

  
O que a contínua exposição a produtos químicos pode causar a mente e ao corpo? Foi essa a pergunta que o escocês Grant Morrison articulou antes de começar a escrever o compêndio de histórias que resultaria em “Batman: Descanse em Paz” (Batman: R.I.P, no original, 2008), onde o morcego depois de uma desgastante luta psicológica e física acaba por sucumbir. Na detalhada e extensa pesquisa que fez para chegar ao último trabalho à frente do personagem que cuidou por um bom tempo, o escritor se aprofundou no período renegado dos anos 50 e 60. “Batman: Arquivo de Casos Inexplicáveis” reúne 12 dessas histórias em edição encadernada com 148 páginas lançada pela Panini Comics em 2013. As tramas datam de 1951 a 1964 e contam com nomes clássicos da época como Bill Finger, Dick Sprang e Charles Paris. Essa fase parcialmente exposta no álbum apresenta o morcego participando das histórias mais absurdas possíveis enfrentando alienígenas, substâncias perversas, terror psicológico e criaturas delirantes, além de adendos ridículos (mas que fizeram sucesso lá atrás) como o Bat-Cão (!) e o Bat-Mirim (!!). Mesmo que ao ler isso atualmente não dê para se apontar muitos méritos, é no mínimo interessante ver onde Grant Morrison foi buscar argumentos para a criação, resumindo tudo como se fosse uma espécie de “Arquivo X” próprio do Bruce Wayne.

Nota: 6,0

“Marvels” chegou às bancas em 1994, com roteiro de Kurt Busiek e arte de Alex Ross. Com alto nível de qualidade e perspectiva diferente do que se via habitualmente, a série foi um sucesso, alavancou a carreira de ambos e até hoje ganha republicações. A talentosa dupla se reuniu novamente para criar uma obra baseada em conceitos e personagens de Jack “King” Kirby, um dos maiores nomes dos quadrinhos de todos os tempos. “Kirby: Genesis” acumula esse trabalho compreendido originalmente entre as edições 0 a 8 que terminaram em 2011 nos EUA com a publicação da Dynamite. Além de Busiek e Ross, dois brasileiros fazem parte e dão importante contribuição ao trabalho: Jack Herbert na arte e Vinicius Andrade nas cores. No suntuoso encadernado lançado pela Mythos Editora aqui, com direito a diversos extras como esboços, textos, layouts e capas alternativas somos apresentados a uma clássica aventura de ficção científica, onde a Terra de repente recebe a visita de duas enigmáticas figuras pairando nos céus. Sabe-se depois que a culpa dessa visita é de uma sonda enviada ao espaço levando uma mensagem ostentando exatamente a imagem dos estranhos recém surgidos. Somado a isso outras aparições acontecem ao redor do globo e um intricado cenário se monta com interesses múltiplos, inclusive a salvação do planeta.  “Kirby: Genesis” é uma esplêndida homenagem a um mestre, e tanto utiliza personagens já conhecidos (Capitão Vitória, Estrela Prateada) como cria algo novo a partir de ideias primárias e, mais importante que isso, consegue exibir brilho próprio.

Nota: 9,0

Textos relacionados no blog:

- Quadrinhos: “Os Invisíveis” – Grant Morrison e vários artistas
- Quadrinhos: “Eternos” – Neil Gaiman e John Romita Jr.


sexta-feira, 13 de março de 2015

Literatura: Coleção "A Torre Negra"

"Já escrevi romances e contos suficientes para encher um sistema solar da imaginação, mas a história de Roland é meu Júpiter, um planeta que faz de anão todos os outros...” (Stephen King sobre “A Torre Negra”)

Stephen King ainda era um jovem universitário nos anos 70 quando começou a rabiscar a ideia inicial de uma saga inspirada no universo criado por J.R.R Tolkien em “O Senhor dos Anéis”, muito antes do diretor Peter Jackson levar a história para o cinema e auferir uma atenção muito maior em torno dela. O hoje premiadíssimo escritor estadunidense usou também como base primária um poema épico do século XIX, de Robert Browning, chamado "Childe Roland to The Dark Tower Came" para compor a série que hoje já foi traduzida para mais de 40 países e vendeu milhões de livros.

A primeira parte dessa epopeia se chama “O Pistoleiro” e inicialmente foi publicada em capítulos dentro de revistas no final dos anos 70, conhecendo sua versão como romance completo apenas em 1982. Em 2004, Stephen King publicou o último dos sete livros originais (chamado “A Torre Negra”), porém é bom salientar que posteriormente em 2012 lançou mais outro (“O Vento na Fechadura”) inserindo ele no meio da trama original, um livro que não chega a agregar quase nada, sendo apenas um pouco de mais do mesmo, nesse caso em específico.

Foram escritas mais de 4.000 páginas para cobrir toda a história de Roland de Gilead, um pistoleiro (o último) condenado a vagar por um mundo devastado em busca de salvação e de achar a torre negra que dá título ao trabalho. Além da claríssima influência já citada dos livros de Tolkien, “A Torre Negra” tem toques do faroeste de Sérgio Leone, da ficção científica de Stanley Kubrick e da literatura de Mario Puzo e Robert Jordan, além de inúmeros enxertos de cultura pop como, por exemplo, o livro “Ardil 22” de Joseph Heller e canções como “Velcro Fly” do ZZ Top e “Paint It Black” do Rolling Stones.

O começo dessa aventura de obstinação, desespero, morte, esperança, terror, suspense, medo e aprendizado começa na perseguição do protagonista a uma enigmática figura em que o tempo se contorce, se quebra e se mistura sem lógica aparente, até formar seu ka-tet (um grupo), concebido através do futuro visto no tarô. Esse grupo tem coadjuvantes fundamentais como Eddie Dean, um viciado em heroína que vive nos anos 80, Odetta, uma paraplégica ativista dos direitos civis e raciais dos anos 60, e o garoto Jake, que precisa ser resgatado de outro mundo depois de morrer por lá.

O início não é fácil e demora a deslanchar, o que só acontece no final do segundo livro e segue sempre respondendo a algumas perguntas e levantando outras, como a razão pela qual o mundo de Roland “seguiu adiante”. Um dos pontos altos é a ambientação dos lugares, que deixa para o leitor um compêndio narrativo capaz de possibilitar a visualização destes locais, principalmente cidades como River Crossing, Lud e Calla Bryn Sturgis. Em determinado momento é inserida outra história do personagem principal, referente ao passado, e isso constrói um adendo interessante pois a trama principal é colocada basicamente de lado, e sobrevive.

Depois de percorrer os sete volumes, conclui-se que “A Torre Negra” não é o tipo de obra que chega ao ápice no final, esse ápice aparece durante a trama, nos livros intermediários. A parte realmente interessante que desafia o leitor está entre os livros 2 (“A Escolha dos Três”) e 6 (“A Canção de Susannah”). O final da saga além de um pouco confuso, exibe leve exercício de ego do escritor (que já havia se inserido dentro da própria trama), para depois amarrar a maioria das pontas soltas no decorrer do caminho e convencer o leitor que o acompanhou por todo o caminho.

“O mais longo romance popular de todos os tempos”, como o autor o intitulou, apresenta muitas qualidades (apesar dos excessos) e tenta se transpor para o cinema e a tevê - sem sucesso infelizmente por enquanto - mesmo sendo encabeçado pelo conceituado diretor e produtor Ron Howard e tendo nomes de peso cogitados para os papéis como Javier Bardem, Russell Crowe e Aaron Paul. Nos quadrinhos já foi feita essa transposição de modo eficiente, sucinto e eficaz, dentro daquilo que poderia se esperar para a trilogia cinematográfica desejada, a fim de que o ambíguo, obcecado e carismático Roland de Gilead alcance um número maior de pessoas com a sua incansável perseguição.

P.S: A Editora Objetiva publicou os sete livros da coleção original aqui no Brasil entre 2005 e 2007, assim como o posterior “Vento na Fechadura” em 2013.

Nota (coleção dos sete livros originais):  8,5