segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

“Different Gear, Still Speeding” - Beady Eye - 2011

O Oasis decretou seu fim, os irmãos Gallagher trocaram mais algumas farpas e cada um foi para o seu lado. Isso já se sabe tem algum tempo, assim como sabe-se que Liam juntou os ex-comparsas de banda Gem Archer e Andy Bell para formar um novo grupo chamado Beady Eye. A grande questão então era: Será que o disco vai ter alguma coisa boa ou será um mero pastiche do (já pastiche) Oasis?
A começar pela capa e pelas primeiras impressões o resultado não seria lá grande coisa e na verdade, quem poderia esperar outra coisa? O cérebro por trás do Oasis era Noel e disso ninguém tinha a menor dúvida. Como Liam comandaria músicos até competentes, com passagens boas por bandas como Heavy Stereo e o ótimo Ride, se até então sua produção tinha sido extremamente sem relevância?
Quando as 13 faixas de “Different Gear, Still Speeding” acabam de passar no player, é difícil até assimilar que o Beady Eye conseguiu produzir algo bom diante de tanta desconfiança (completamente justificável, que se diga). Com a inclusão de Chris Sharrock para completar o time, Liam começou a virar o jogo quando contratou Steve Lillywhite (de U2, Morrisey e Rolling Stones) para a produção.
Steve Lillywhite pegou as canções do grupo e deixou de acordo com a sonoridade que Liam tanto gosta, focando diretamente para os anos 60 e 70, sem trazer muitas invencionices ou mesmo uma lapidação exagerada. A banda aproveitou os rumos do bom último disco do Oasis (“Dig Out Your Soul” de 2008) e fez um trabalho superior a álbuns como o “Don’t Believe The Truth” de 2005, por exemplo.
Evidente que a comparação com o Oasis será muito traçada quando “Different Gear, Still Speeding” for tocado por aí e não dá para fugir completamente dela, por mais óbvio que seja. No entanto, seria covardia compará-lo com os dois primeiros discos lançados em 1994 e 1995. Tem que é se reconhecer que Liam se virou muito bem sem o apoio do irmão, um craque em elaborar melodias e canções pungentes.
Logo no rockão de abertura com “Four Letter Word”, temos um “nada dura para sempre” cravado ali pelo meio dos acordes. No geral, a sonoridade é fundamentada nos tão amados Beatles e Rolling Stones além de outras bandas do período (com direito até a um Led Zeppelin III eficiente em “Millionaire”), mas não foge da pegada do britpop como mostram as faixas “Wind Up Dream” e “Three Ring Circus”.
Seria um exercício e tanto de previsão afirmar se o Beady Eye durará ou se a “queda” do Oasis não é mais um truque de marketing para o futuro. Dos irmãos Gallagher pode-se esperar quase tudo. O que dá para dizer é que “Different Gear, Still Speeding” é um bom disco de rock e anotar quando Liam canta em “Beatles And Stones”: "Vou resistir ao teste do tempo/como Beatles e Stones." Será? É pagar para ver.
Site oficial: http://www.beadyeyemusic.com

domingo, 27 de fevereiro de 2011

"Bruna Surfistinha" - 2011

O enredo da história é aquele mesmo de tantas outras vezes. A pessoa tem uma adolescência complicada e resolve trilhar um caminho diferente do que todos esperavam. No decorrer desse caminho existem momentos intensos de provação, até que chega a fama e o reconhecimento que logo vão trazer consigo drogas e álcool. A pessoa então cai, passa por uma via crucis no inferno, mas consegue se recuperar e alcança a redenção no final de tudo.
Independente de ser um artista, um esportista, um político ou mesmo um cidadão comum, esse enredo já foi contado inúmeras vezes no cinema alcançando na maioria das vezes resultados medianos, por mais que tenhamos também exemplos de grandes trabalhos. A trajetória da paulista Raquel Pacheco, mais conhecida em todo o Brasil como “Bruna Surfistinha”, traz no seu cerne basicamente a mesma coisa e um resultado igualmente mediano.
Olhando o filme “Bruna Surfistinha” somente como cinema, o resultado é muito baixo. Deborah Secco embora seja infinitamente mais bonita que a Raquel Pacheco original, não consegue convencer no papel, principalmente no ínicio quando contracena com a geração do colégio da moça. Nos momentos de maior sensualidade e malandragem, ela até que se sai bem (e preenche a tela com ótima forma), o que acaba compensando um pouco as passagens ruins.
Agora se olharmos apenas para a questão do entretenimento e do conseqüente apelo comercial do filme, “Bruna Surfistinha” tem tudo para alcançar ótimos números de público, como o próprio dia da estréia já demonstrava nas filas do cinema. A história da menina que saiu de casa jovem para ganhar a vida como prostituta nas ruas de São Paulo e virou celebridade por conta de um blog das suas experiências, traz os ingredientes necessários para o sucesso.
O diretor Marcus Baldini apenas circunda os temas espinhosos que se sugerem, fazendo uma imensa novela como é comum no cinema nacional. “Bruna Surfistinha” não é um bom filme, mas acaba sendo um razoável entretenimento, já que essas coisas necessariamente não precisam andar juntas. Vai servir para deixar Deborah Secco (atual capa da Rolling Stone) mais famosa e inserir alguns milhares de reais nas contas dos envolvidos diretos e do pessoal da pirataria.
Site da Bruna Surfistinha: http://naonaopara.virgula.uol.com.br/brunasurfistinha

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

"50 Anos a Mil" - Lobão com Cláudio Tognolli

“A partir de agora, vou contar uma história de amor louca, insólita, humana, demasiadamente humana, imprevisível, improvável, mas bem real: a história da minha vida, que se mescla e se confunde com a da minha geração, do nosso país e do nosso tempo. (...) É uma história cheia de vida, de intensidade e de revelações, que incide no presente e se projeta em direção ao futuro.” Assim se apresenta a biografia de João Luiz Woenderbag, mais conhecido como Lobão.
Poucas vezes a apresentação de uma biografia resume tão bem o que será lido posteriormente quanto essa “50 Anos a Mil”, que Lobão escreveu junto com o jornalista Cláudio Tognolli e que a Editora Fronteira lançou no final de 2010 com 596 páginas. Um dos nomes mais controversos da música nacional, o que de certa forma apagou um pouco a qualidade da sua obra, é uma fonte quase inesgotável de causos e de uma vida, louca vida, como diz uma das suas canções.
Quem está acostumado as declarações fortes e ácidas se deparará com um cara amável (por mais que estranho) na infância e adolescência, antes de adentrar o mundo da música e acentuar sua personalidade forte, assim como seus medos e absorção de diversas peculiaridades oriundas de uma família problemática. De baterista do Vímana no final dos anos 1970 (banda com Lulu Santos e Ritchie) até a vida como apresentador da MTV, temos Lobão na sua melhor forma.
O temperamento de Lobão transparece em vários episódios, como na saída da Blitz no começo do sucesso da banda que seria um dos maiores fenômenos do showbiz brasileiro, preferindo ir para uma carreira solo. No decorrer de “50 Anos a Mil”, essa crença pela qualidade do próprio trabalho é uma constante. Por mais que diversas vezes haja questionamentos de vida e até mesmo tentativas de suicídio, a música quase sempre não é questionada por ele.
Constantemente na contramão da história, mesmo que em alguns momentos acabe sucumbido a tudo que critica, Lobão tem excelentes trabalhos como “Vida Bandida” de 1987 e “A Vida é Doce” de 1999 e conta sua história com o humor que sempre demonstrou, fazendo assim da sua biografia uma leitura extremamente prazerosa. Podemos até duvidar de algumas situações narradas por ele, mas como se trata de quem é, tudo acaba sendo plenamente possível no final das contas.
Site Oficial: http://www.lobao.com.br Twitter: http://twitter.com/lobaoeletrico

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

"Crônicas Birmanesas" - Guy Delisle

O canadense Guy Delisle é persona non grata em países como a China e a Coréia do Norte. O ilustrador e animador passou por eles a trabalho e cunhou suas impressões em diários de viagens que resultaram nos quadrinhos de “Shenzhen” e “Pyongyang”. A Zarabatana Books publicou essas obras aqui anos atrás em conjunto com a última, “Crônicas Birmanesas”, onde conta suas impressões sobre a Birmânia e/ou Myanmar, um país no sul da Ásia.
O motivo que levou Guy Delisle a não ser bem quisto nos países em que visita e posteriormente retrata nos quadrinhos, é porque em todos eles escancara a deformidade do regime político do país e as conseqüências que são geradas para a população. Agora difere bastante do (ótimo) discurso de nomes como Joe Sacco e usa uma verve extremamente bem humorada e levantando de modo sucinto questões que podem ser mais explanadas.
Ao ler “Crônicas Birmanesas” que foi lançado aqui em 2009 e tem 267 páginas, vemos um autor que dessa vez não foi (pelo menos diretamente) a trabalho e sim acompanhar a esposa que passaria um ano lá por conta dos Médicos Sem Fronteiras. Com um pequeno filho para cuidar, a visão de Guy Delisle continua perspicaz e faz o leitor mergulhar em uma cultura plenamente diferente, retratando esta com o habitual traço e uma certa rabugice.
Para quem conhece as obras anteriores, esse “Crônicas Birmanesas” não aponta nada de extremamente novo, mas existem pequenas variações. A mais visível é o encontro com a paternidade que rende momentos bem explorados. Na contramão disso, no entanto, o tom rabugento é mais ampliado que anteriormente e se torna chato em algumas passagens, além do fato que a visão de “primeiro mundo” sobre os “países menores” às vezes incomoda.
Mas esse lado ruim não chega a atrapalhar muito e “Crônicas Birmanesas” é uma leitura bem aprazível, que parece contada por um amigo recém chegado de viagem. Uma das maiores vantagens da leitura sempre foi transportar quem lê para outras culturas e outros países sem precisar levantar da cadeira de casa, e isso é plenamente explorado nos álbuns de Guy Delisle. É para ler e sorrir, como também refletir sobre os modos da política em geral.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

"Se Rasgum Clássica" com Aeroplano - Café Com Arte (PA) - 25.02.2011

Nesta sexta feira, dia 25 de fevereiro de 2011, o Aeroplano lança seu disco de estréia intitulado "Voyage", na tradicional festa "Se Rasgum Clássica" no Café com Arte. Antes a banda passa pela Saraiva Megastore para tocar de modo acústico as canções do primeiro trabalho à partir das 19 horas.
Vale muito a pena.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

"Bravura Indômita" - 2011

Nos últimos anos, os irmãos Joel e Ethan Coen fizeram filmes como o esplêndido “Onde Os Fracos Não Tem Vez” (2007) e o ótimo “Um Homem Sério” (2009). Depois desse último resolveram então arrumar uma grande sarna para se coçar. Optaram por refilmar um clássico dos anos 60 do diretor Henry Hattaway, que conduziu John Wayne ao seu único Oscar da carreira. Um remake feito pela dupla gerou desconfiança em um primeiro momento.
No entanto, ao acabar a sessão de “Bravura Indômita”, conclui-se que novamente a dupla conseguiu realizar um excelente trabalho. A história da jovem Mattie Ross (Hailee Stenfield) na procura de vingança pelo assassinato do seu pai por um funcionário, ganha todo o tratamento que os filmes dos Coen costumam ter, por mais que o cinismo tenha sido diminuído, e tenha ficado a opção por realizar uma obra mais sóbria, um faroeste tradicional.
Quando a jovem de 14 anos busca contratar um policial federal para caçar o culpado pela morte do pai, depara-se com um beberrão de primeira, o caolho Rooster Cogburn (papel anteriormente de John Wayne, agora interpretado por Jeff Bridges). Mesmo com todos os sinais indicando não ser uma boa idéia sua contratação, Mattie parece ver algo mais nele e remete a uma frase de Platão: "Não é preciso que a bondade se mostre; mas sim é preciso que se deixe ver."
Ao sair nessa inusitada caçada atrás de Tom Cheney (Josh Brolin) nos territórios indígenas dos USA de 1870 e pouco, a criança e o caolho ainda tem um Texas Ranger cruzando seu caminho. La Boef (Matt Damon) também está caçando o fugitivo e coloca a serviço da trama uma inexperiência e ambigüidade que vão servir de contraponto em várias ocasiões. Conflitos pessoais e diálogos bem elaborados servem de pano de fundo para que a película se desenvolva.
Em “Bravura Indômita”, os irmãos Coen mostram classe em uma adaptação vigorosa e com elenco em grande forma, com destaque para Hailee Stenfield, extremamente à vontade. É um filme para ser entendido por vários aspectos, mas primordialmente sobre os olhares da coragem e da bondade, que por serem tão antigas quanto o tempo remetem a outra velha afirmativa, dessa vez de Voltaire: "Todo homem é culpado por todo bem que ele não fez."
Sobre “Um Homem Sério”, aqui. Sobre “Onde Os Fracos Não Tem Vez”, aqui.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

"O Besouro Verde" - 2011

O seriado “O Besouro Verde” estreou na televisão nos anos 60, ganhando fãs e toda uma aura cult posteriormente, devido principalmente a presença de Bruce Lee nele. O ator Seth Rogen de “Ligeiramente Grávidos” e “Segurando As Pontas” é um desses fãs que a série acumulou com o decorrer dos anos. É dele que resultou grande parte do empenho para que a idéia original fosse convertida em um filme dentro dos padrões atuais e para todo um novo público.
O longa passou por diversos problemas na produção, trocou de diretor, de atores e ficou meio à deriva. Seth Rogen então partiu para uma ofensiva e conseguiu o diretor Michel Gondry (de “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”) para dirigir e assinou o roteiro junto com Evan Goldberg. O resultado pelo menos financeiramente se tornou bastante notável, visto que o longa estreou em primeiro lugar nos Estados Unidos antes de desembarcar aqui.
Antes de entrar na sala para assistir “O Besouro Verde” é extremamente necessário se soltar das amarras habituais que se pode ter referente a qualidade. Esqueça um roteiro elaborado e sem falhas, justificativas razoáveis para os acontecimentos ou atuações convincentes. Esqueça também que o filme é em 3-D, pois isso pouco acrescentará no final. Se você tiver a habilidade para deixar tudo isso largado na porta da sala, talvez consiga achar graça e se divertir.
A história gira em torno de Britt Reid (Seth Rogen), filho mimado de um milionário dono de um jornal em Los Angeles. Quando o pai falece e sem demonstrar muito claramente os porquês, Reid encontra em Kato (Jay Chou) um amigo, e mais ainda um ajudante para corroborar suas insanidades “adolescentes”. Os dois entram de brincadeira no combate ao crime, sem ter noção do que estão fazendo e acabam por aperfeiçoar seus métodos pouco a pouco.
Michel Gondry guia uma sátira aos super heróis, ao mesmo tempo em que mostra um bom desempenho nas cenas de ação e nos diálogos. E fica por aí. “O Besouro Verde” funciona apenas como um passatempo para ser digerido em duas horas e esquecido logo em seguida. Até diverte, mas é preciso muito boa vontade para tanto. No mais, parece que Michel Gondry não tem talento para o besteirol e a ação descompromissada, mesmo sem saber se isso é bom ou ruim.
P.S: O filme também tem a Cameron Diaz, mas ela está tão sem sal e sem graça, que é melhor nem comentar.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

“The Party Ain't Over” - Wanda Jackson - 2011

A bateria faz a contagem e os metais entram preparando um clima de futura explosão para retomar com um riff de guitarra que antecede um vocal rasgado avisando: “When you move in right up close to me/That's when I get the shakes all over me”. O ritmo é dançante, mas também um pouco sujo e acelerado. Nas caixas, a frenética "Shakin 'All Over" (de Johnny Kidd & The Pirates) que até o Mundo Livre S/A já regravou, ganha mais um releitura.
É nesse ritmo acelerado que aquela que um dia namorou Elvis Presley, foi a primeira mulher a gravar um rock, cunhou pequenos clássicos como "Fujiyama Mama", e ganhou títulos como “A Primeira Dama do Rockabilly” chega novamente a um disco. Wanda Jackson hoje passa dos 70 anos e tem uma extensa discografia que viaja por diversos tipos de música, mas provavelmente poucas vezes soou tão visceral quanto nesse “The Party Ain't Over”.
O nome do trabalho é plenamente apropriado. As onze canções que o compõe promovem uma zoeira das boas, na qual permanece a essência dos anos 50 e 60 acoplada de uma roupagem mais podreira, cortesia de Jack White, responsável pela produção. É impossível não associar na sonoridade aquilo que o músico gosta nos seus diversos projetos. Os instrumentos ficam com membros do My Morning Jacket, Racounters e Dead Weather, além do próprio White.
O repertório se traduz em uma fidelidade aos contemporâneos da época de Wanda Jackson e caminha com passos fortes entre composições tocadas anteriormente por Eddie Cochran (“Nervous Breakdown”), Elvis Presley (“Like a Baby”), Bill Halley (“Rip It Up”) e Harlan Howard (“Busted”). Também apresenta coisas mais atuais como versões para “You Know That I'm No Good” da Amy Winehouse e a ótima “Thunder On The Mountain” do Bob Dylan.
E é nessa versão de “Thunder On The Mountain” que o disco alcança o seu auge em um boogie-woogie misturado com rockabilly espirituoso e potente, com guitarra e metais duelando bravamente. “The Party Ain't Over” chama mais atenção por conta do envolvimento de Jack White no projeto, mas consegue ir além e se sustenta muito bem, revitalizando a carreira de uma senhora que já faz um tempinho que sabe o que é esse tal de rock n’ roll.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

"Antes Tarde do Que Sempre" - Bertoldo Contijo

Aldo está na casa dos 30 anos e quando olha para trás depois de receber uma garrafada na cabeça em um show de punk rock, percebe que não construiu muita coisa e está vivendo sem muito prazer nos últimos tempos. Trabalha em uma agência publicitária escrevendo propagandas e textos para os mais diversos e inusitados tipos de produto. Apesar de não ser tão ruim, não consegue se sentir totalmente bem. Sua paixão mesmo é a guitarra e a música.
Como tantos outros, Aldo passou por todos os fantasmas da adolescência e só conseguiu ganhar algum prestígio na escola ao montar uma banda de rock. Nesse período difícil, teve aquelas paixões avassaladoras, como a bela e certinha Júlia, que mesmo depois de quinze anos ainda é guardada dentro da sua cabeça. É nesse ponto da vida de Aldo que o escritor paulista Bertoldo Contijo apresenta esse problemático normal em “Antes Tarde do Que Sempre”.
O livro foi lançado no final de 2010 pela Editora Draco e tem 136 páginas. Mesmo tendo um título não tão inspirado (apesar da capa ser ótima), esse pequeno romance é uma leitura prazerosa. Bertoldo Contijo traça três espaços para contar a vida de Aldo. Primeiro na época da escola, depois dentro da crise dos 30 e fecha em “autodiálogos” explorados em páginas pretas. É literatura pop que remete ao “Clube dos Corações Solitários” do André Takeda.
Ao lado de Aldo, um personagem que apesar das poucas páginas consegue ser bem desenvolvido, temos um pequeno grupo curtindo suas próprias desilusões, como a amada Júlia, sua melhor amiga Cris e o amigo e parceiro de banda Júnior. Todos com seus 30 e poucos anos, viram em algum ponto as coisas deixarem de fazer sentido e seguem no piloto automático, tendo momentos de prazer entrecortados com muitos outros de dúvidas e desamparo.
“Antes Tarde do Que Sempre” é um livro para ser consumido de uma tacada, uma pequena viagem pelo mundo de um cara apaixonado por rock e repleto de incertezas passeando na sua frente. É leve, descontraído e por mais que carregue alguns temas mais pesados de modo subentendido, acaba por não escorregar neles e partir para o drama desnecessário. É para ler e botar algum disco dos anos 70 para tocar bem alto nas caixas de som.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

"Cicatrizes" - David Small

Até que ponto as marcas da infância e adolescência podem contribuir negativamente para o futuro de uma pessoa? E se essas marcas além de psicológicas, também forem físicas? O quão difícil será para se livrar delas no restante da vida e seguir em frente? Quanta força de vontade será necessária? Olhando toscamente para essas perguntas podemos afirmar que fazem parte de um livro qualquer de superação ou de uma história hollywoodiana sem graça.
No entanto, é em cima dessa base suspeita e perigosa que David Small (um premiado ilustrador infantil norte americano) criou “Cicatrizes”, história em quadrinhos lançada na gringa em 2009 e que chegou por aqui no final do ano passado pelas mãos das Editoras LeYa e Barba Negra. Com 336 páginas e tradução de Cassius Medauar, a graphic novel ganhou um acabamento editorial cuidadoso, que ajuda muito para que a obra seja melhor apreciada.
Fazer biografias usando os quadrinhos além de se tornar bem comum, começa a ser uma tremenda válvula de escape para estender o poder da criação nessa esfera. Por mais que algumas vezes o resultado seja insatisfatório ou mediano, isso não interfere na geração de obras realmente boas como o álbum em questão. David Small anda na mesma praia do estupendo Art Spiegelman e de nomes mais novos como Craig Thompson e o brasileiro Caeto.
“Cicatrizes” demorou um bocado de tempo para ser escrita. Nascido em 1945 na cidade de Detroit, o autor só conseguiu exorcizar seus fantasmas através de desenhos e palavras depois dos 60 anos. A infância que parecia até certo ponto normal, foi atropelada por um tumor na adolescência que levou o jovem a perder uma corda vocal e parte da fala. E ainda teve que viver dentro de uma família sufocante e sem o menor tato amoroso para a criação dos filhos.
Mesmo sem um desenho espetacular, os traços focam diretamente nas feições e nas paisagens, o que serve plenamente para desenvolver toda a dramaticidade e humor involuntário que se anseia. Após a leitura de “Cicatrizes” o sentimento é de uma angústia sem explicação, já que apesar de tudo a história tem um final feliz. David Small consegue fugir do piegas e da obviedade para mostrar uma história triste e agonizante de modo bonito e poético.