domingo, 8 de novembro de 2015

Literatura: "Trash" e "A Garota da Banda"


Ano passado o diretor Stephen Daldry de filmes como “Billy Elliot” e “As Horas” lançou sua versão cinematográfica para o romance juvenil “Trash”. Gravado no Brasil e com atores nacionais no elenco como Wagner Moura e Selton Mello, o longa é adaptado da obra do inglês Andy Mulligan originalmente publicado em 2010. Em 2013 a Cosac Naify colocou aqui esse trabalho (que ganhou reimpressão em 2014) com tradução do escritor Antônio Xerxenesky e 224 páginas. O livro tem como protagonista o jovem Raphael Férnandez que vive no lixão de Behala e de lá tira o sustento em situações nada magníficas. O autor, que também é professor, não ambienta a trama em um país específico, mas tirando pelas suas andanças por Índia, Filipinas, Vietnã e Brasil, pode-se afirmar que tem um pouco de cada nessa criação. Ao fazer seu trabalho revirando o lixo para separar e revender, o personagem principal se depara com um bolsa contendo dinheiro e mais alguns importantes papéis. O que à primeira vista representa um grande prêmio, se revela como algo bem mais grave quando a polícia invade o local preocupado em encontrar essa bolsa. Quando esconde da polícia esse fato e percebe que o buraco é bem mais embaixo, Raphael se vê em uma grande aventura junto com os amigos de lixão Gardo e Rato. Dentro desse contexto, Andy Mulligan versa pelo caminho sobre pobreza, abuso de poder, política e desigualdade social, usando como recurso narrativo a voz não somente de Raphael, mas de vários envolvidos que vão assumindo os capítulos e que ajudam a dar uma boa visão ao leitor, ainda mais com a utilização de fontes distintas para cada pessoa. “Trash”, no entanto, é apenas uma aventura razoável, que não consegue se expandir muito do raso raciocínio e expõe o olhar estrangeiro caricato sobre as mazelas dos países do terceiro mundo. Sim, é repleto de boas intenções, porém fica somente nisso e não vai muito além como leitura.

Nota: 6,0


Em 14 de novembro de 2011 o Sonic Youth subia no palco do Festival SWU na cidade paulista de Paulínia para fazer o último show de uma carreira de 30 anos artisticamente impecável. Ali seria a derradeira vez em que a banda executaria canções como “Sugar Kane”, “Teenage Riot” e “Death Valley 69’”. E é nesse show que a baixista Kim Gordon começa sua autobiografia. De maneira triste, arrasadora e assustadoramente honesta narra os últimos dias que culminaram na apresentação em um capítulo que é tão brusco que a emoção toma conta. Kim Gordon é muito mais que uma música. É artista visual, atriz, diretora, produtora, empresária. Uma mulher e tanto, mas que como a maioria de nós pobres mortais tem dúvidas, medos, vergonhas e arrependimentos. “A Garota da Banda” (Girl in a Band, no original) foi publicado esse ano e sai por aqui também em 2015 pelo selo Fábrica231 da Editora Rocco, com tradução conjunta de Alexandre Matias e Mariana Moreira Matias e 288 páginas. O livro de Kim Gordon é como um romance torto de formação em que o Sonic Youth é responsável por vários capítulos, mas ainda assim é coadjuvante da vida pessoal da autora que passeia por uma Nova York que não existe mais e por entre nomes distintos de vários setores da arte. Expondo pensamentos sobre pessoas do meio musical como Courtney Love e, lógico, o marido Thurston Moore, entre tantas outras, Kim Gordon apresenta ao leitor um retrato de uma personalidade forte por mais que sempre tenha sido meio intimista. É um retrato de uma mulher que tocou a vida em meio a um mundo e a um meio claramente machistas, mas que se saiu muito bem. Uma mulher que optou em fazer uma música não convencional em uma época em que, como ela própria diz no livro, a palavra ruído era um insulto, a coisa mais desprezível que podia se usar contra a música. “A Garota da Banda” é um livro avassalador, para se ler mais de uma vez e depois guardar ali na estante ao lado de “Só Garotos” da Patti Smith.

Nota: 9,5


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