terça-feira, 22 de maio de 2012

Santos Jazz Festival - 14 a 17 de Junho de 2012


Salve, salve minha gente amiga...

Eis uma bela pedida para quem está no estado de São Paulo entre 14 e 17 de junho. Vai rolar o “Santos Jazz Festival” na cidade de Santos, com programação gratuita e grandes nomes do gênero. Hermeto Pascoal será o patrono da 1ª edição.

Leia mais:

“Com o objetivo de democratizar o acesso à música de qualidade e estabelecer o município de Santos como referência no fomento musical, será realizado, de 14 a 17 de junho, o 1º Santos Jazz Festival (www.santosjazzfestival.com.br). Trata-se do primeiro grande festival de jazz do litoral paulista, apoiado pela Lei Rouanet. Serão vinte apresentações, mais oficinas, todas gratuitas, em ruas e boulevares do Centro Histórico, Bolsa Oficial do Café e teatros Coliseu e Guarany.

Para começar com o pé direito, o festival terá como patrono Hermeto Pascoal. Celebrado internacionalmente, o compositor, arranjador e instrumentista de 76 anos fará o show de abertura, ao lado da Orquestra Sinfônica de Santos e da Jazz Big Band. Na programação, constam outros nomes reconhecidos nacionalmente e fora do Brasil, a exemplo de Yamandu Costa, Heraldo do Monte, Arismar Espírito Santo, André Christovam e Delicatessen.”

O Santos Jazz Festival também está nas redes sociais. Acompanhe:


Então, fique atento. Se tiver pela região, não perca este evento.

Paz sempre!

domingo, 20 de maio de 2012

Séries: "Preamar"


A HBO cada vez mais se consolida no mercado norte-americano de geração de séries, com um aproveitamento qualitativo elevadíssimo. Como política própria, a empresa também busca produtos, em parceria ou não, que a identifiquem nos mercados explorados, como é o caso da HBO América Latina. Essa política já gerou bons frutos no Brasil com “Filhos do Carnaval” e “Alice” e se prolongou em outros países como México, Argentina e Chile.  

“Preamar” é a nova aposta do grupo e estreou dia 06 de maio, com exibições semanais às 21:00hs nos domingos. Criada por Estevão Ciavatta, Patrícia Andrade e William Vorhees, tem produção da Pindorama Filmes e roteiro assinado pelos criadores em conjunto com Jô Hallack. Na série trata-se principalmente sobre a derrocada de uma família bem-sucedida do Rio de Janeiro e a transformação que se faz imperativa para todos que estão envolvidos.

Tudo começa com João Ricardo Velasco (Leonardo Franco), um sócio de banco de investimentos que ostenta uma vida confortável e cercada por luxos. Reside em um prédio na Avenida Viera Souto em Ipanema, de frente para o mar e de todos os encantos da cidade maravilhosa. A família é composta pela esposa Isabel (a ótima Paloma Riani) e os filhos Fred (Hugo Bonemer) e Manu (Jessika Alves), com os quais o pai tem pouco contato real.

Em virtude de uma grande jogada financeira feita de modo equivocado, João Ricardo é “convidado” a sair do Banco e têm os bens confiscados, exceção feita ao prédio onde mora que está no nome da esposa. Sem muitas explicações dessa jogada, a trama coloca o patriarca pela primeira vez em muito tempo na rotina da família e ele passa a perceber que não conhece quase nada do funcionamento daquela casa, assim como dos desejos e aflições dos seus habitantes.

Sem saber como repassar a notícia, ele inventa uma desculpa qualquer e se prepara para manter as aparências e pensar nos dias vindouros. É quando percebe o grande mercado informal que se desenrola praticamente na porta da sua casa. Ajudado pelo servente Biu (Sóstenes Vidal), resolve aplicar seus conhecimentos para esses negócios e entra em contato com o dono do pedaço chamado Xerife (o experiente Ricardo Bonfim) e seu auxiliar Wallace (o cantor Mumuzinho).

“Preamar” apresenta uma jornada de descobrimento e aproveita para surfar um pouco nas ondas dos mercados de investimentos, como também tratar de relações pessoais, ambições e orgulho. No recheio disso coloca drogas, prostituição e transações questionáveis. Com um elenco composto na maioria por nomes desconhecidos, busca se encontrar em atuações ainda cambaleantes, mas com potencial de reverter esse quadro através da história, enquanto olha as belezas da cidade que lhe serve de abrigo.

Nota: 6,5


Assista a um vídeo sobre a série:

sexta-feira, 18 de maio de 2012

"Sunset Park" - Paul Auster


É comum que a história de um livro ou de um filme encontre o personagem principal em algum ponto de deslocamento, de mudança. Nesse período, igualmente é comum esse personagem relembrar ou ter narrada a sua vida passada, a fim de justificar os atos atuais e assim legitimar ações e sentimentos. E é assim que se encontra Miles Heller em “Sunset Park”, livro de Paul Auster que a Companhia das Letras publica agora com 280 páginas e tradução de Rubens Figueiredo.

Atualmente com 65 anos e mais de uma dezena de livros publicados, Paul Auster escolhe nesse novo romance passear pelo condado do Brooklyn em Nova York, um lugar que conhece tão bem. O nome vem de um bairro da região que abriga um número acentuado de imigrantes e que sofreu como o restante do país com a crise imobiliária e financeira de 2008, ano onde a trama realmente se desenvolve mais. A crise, aliás, é uma coadjuvante importante para o contexto geral.

“Num mundo que desmorona, num mundo de ruína econômica e de agruras implacáveis”, como o próprio autor escreve logo no princípio, as pessoas tentam se equilibrar e seguir adiante. Miles Heller entra mais de cabeça nesse mundo quando depois de mais de sete anos sem dar notícias aos pais, acaba retornando a Nova York fugindo de dramas vinculados a paixão que começou a dar sentido novamente a sua amortecida vida, uma jovem garota de nome Pilar.

Essa fuga o direciona para uma casa desbotada e estilhaçada que passa a ocupar junto com outras três pessoas. A invasão tem como cúmplices o velho amigo Bing Nathan, a única pessoa da antiga vida que manteve contato durante os anos, e mais Alice Bergstrom, uma idealista em busca do doutorado, e Elle Brice, uma pintora amargurada que trabalha como corretora de imóveis. Do outro lado estão os pais divorciados, um respeitado proprietário de editora e uma atriz de sucesso.

Em “Sunset Park” nos deparamos com temas tão comuns a Paul Auster como a solidão das pessoas, no entanto, de modo menos mascarado que em outras oportunidades. Os personagens são solitários em sua maioria, embora estejam em alguns casos envolvidos com várias pessoas. Esse sentimento de isolamento aparece por várias vertentes, sejam elas sociais ou profissionais e se entrelaçam com culpas e uma permanente tensão sexual se escondendo atrás das cortinas.

Desvencilhando individualmente cada indivíduo, o autor cria um território próprio para cada um mostrar suas dores e complicações, sem se esquecer de contrabalançar com a trama coletiva. Essa separação rende ocasiões sensacionais, como em um capítulo dedicado a Alice Bergstrom onde as dúvidas do relacionamento afetivo forjam uma conexão com o filme “Os Melhores Anos de Nossas Vidas”, um drama do pós-guerra dirigido por William Wyler em 1946.

Mesmo sem ser brilhante, Paul Auster assume em “Sunset Park” que o conceito conhecido como América está esgotado e cutuca o governo com poucas, mas ótimas, frases. Além disso, analisa uma geração que sente necessidade constante de se comunicar sem que isso necessariamente represente acréscimo na vida de alguém. Para a maior parte dos personagens os dias dourados ficaram para trás e os arrependimentos pelos atos praticados não são suficientes para retomar o futuro que um dia fora sonhado.

Nota: 7,5



Textos relacionados:
- Literatura: "A Trilogia de Nova York" - Paul Auster


A Companhia das Letras liberou um pequeno trecho do livro gratuitamente. Aqui: http://www.companhiadasletras.com.br/trechos/12941.pdf

terça-feira, 15 de maio de 2012

"Blunderbuss" - Jack White - 2012


Entre aquelas pessoas que produzem algo de esplêndido na vida, algumas atingem essa façanha logo nas primeiras investidas, outras demoram a vida toda e só conseguem obter esse resultado já nos últimos anos de existência. Contudo existe um terceiro grupo. Esse grupo é composto por indivíduos que gradualmente crescem a cada ano, a cada nova empreitada, a cada novo projeto e que vez ou outra preenchem os espaços com acessos de brilhantismo até chegar ao ápice tão desejado. Jack White faz parte desse time.

Prestes a completar 37 anos, esse norte-americano nascido na industrial cidade de Detroit no estado do Michigan, apareceu verdadeiramente para o mundo da música em 1999 com o registro de estreia do White Stripes. Uma década de discos depois alcançou o reconhecimento dentro do mundo alternativo e fora dele ganhou respeito de nomes de peso do rock internacional como retratado no documentário “A Todo Volume” de 2009, estrelado por ele em conjunto com Jimmy Page (Led Zeppelin) e The Edge (U2).

Sempre inquieto, Jack White encabeçou outros projetos (The Racounters/The Dead Weather), montou uma gravadora e começou a produzir no atacado. Com o anunciado fim do White Stripes ano passado, chegou então a hora de um trabalho solo. “Blunderbuss” tem lançamento pela Third Man Records e em pouco mais de 40 minutos mostra a mesma essência anterior, porém com leves mudanças na apresentação, como também um preenchimento mais completo, onde todos os instrumentos (tocados por ele mesmo) aparecem.

“Blunderbuss” não evidencia o artista andando por outros caminhos. As preferências batem ponto com frequência como o blues, country, rock setentista, garage rock, folk e bluegrass, estes dois últimos com uma participação maior que outrora, mas nada tão incisivo. A mudança chega por outro viés. Como o escritor C.S. Lewis disse: “Mera mudança não é crescimento. Crescimento é a síntese de mudança e continuidade, e onde não há continuidade não há crescimento”, o que cai como uma luva para Jack White nesse momento.

As 13 faixas do álbum refletem claramente a pequena mutação que Nashville exerce atualmente sobre suas composições e não fogem, obviamente, de apresentar letras pessoais que tratam tanto do final da ex-banda, quanto do casamento com a modelo Karen Elson que igualmente se foi em 2011. Com pianos e violões mais presentes, Jack White proporciona ao ouvinte uma pequena jornada pelos estilos que admira, indo desde as repetições da abertura de “Missing Pieces” até as variações finais de “Take Me with You When You Go”.

O meio desses dois pólos é preenchido por faixas que remetem a antiga banda como “Sixteen Saltines” e “Freedom at 21”, essa com um riff simples e marcante. Se estende por “Love Interruption” que remete a fase “III” do Led Zeppelin e apresenta uma das letras mais significativas, com o amor sendo requerido de modo quase que desesperado. Os anos 70 também estão vivos na balada da faixa-título e na absolutamente vintage “On and On and On” que apresenta um riff notável em cima da bela melodia que lembra Paul McCartney.

As baladas comparecem em número relevante e vão desde o piano com ecos de Tom Waits de “Hypocritical Kiss”, onde Jack White busca esquecer o que passou na letra, até a experimental “I Guess I Should Go to Sleep”, com alguns interessantes toques de jazz. Para compensar na energia surgem do outro lado coisas como “I'm Shakin'”, um rockabilly dos anos 50 clássico, porém sujo, com direito a palmas, backing vocals e guitarras distorcidas, além do pop grudento com raízes tradicionais de “Hip (Eponymous) Poor Boy”.

“Blunderbuss” é um disco que mostra um artista no apogeu da sua carreira profissional. Seguro e abarcando todas as etapas de concepção, partindo da criação e chegando até a distribuição, mostra que é possível se adequar aos tempos modernos usando bases mais antigas. Almeja (e consegue) revigorar o rock atual privilegiando sonoridades passadas e corresponde as expectativas, corroborando a assertiva de que grandes realizações sempre acontecem em uma estrutura de grandes expectativas. Uma assertiva que Jack White tirou de letra.

Nota: 9,5

Site oficial: http://jackwhiteiii.com

Textos relacionados:

Assista “Love Interruption” ao vivo no programa Saturday Night Live: 

domingo, 13 de maio de 2012

"Kind Of Blue - Miles Davis e o álbum que reinventou a música moderna" - Richard Williams


Muito provavelmente “Kind Of Blue” é o disco de jazz mais conhecido de todos os tempos. Com ele, Miles Davis recondicionou o estilo e a própria carreira e desde que foi lançado nos Estados Unidos em 17 de agosto de 1959 recebeu reedições diversas, além de textos e livros que permeiam sua concepção como o ótimo “Kind Of Blue - A história da obra-prima de Miles Davis” de Ashley Kahn que a Editora Barracuda lançou por aqui em 2007.

Em “Kind Of Blue - Miles Davis e o álbum que reinventou a música moderna”, o inglês Richard Williams opta por outro caminho. Antes de falar sobre o álbum, tenta estabelecer paradigmas sobre o antes e conjecturas sobre o depois. Visa não somente explanar como o músico foi se dirigindo ao momento da criação que resultou no registro, mas também tratar dos efeitos que essa obra exerceu na época, assim como posteriormente foi demonstrando a cada ano.

Com 288 páginas, tradução de Fal Azevedo e publicação pela Casa da Palavra em 2011, o livro atravessa os momentos anteriores ao “Kind Of Blue” como a fase dentro do bebop, a primeira turnê pela Europa, o envolvimento com a heroína e o encarceramento na Riker’s Island. Ao desembarcar em “Miles Ahead” de 1957, mostra uma mudança significativa quando ocorre a troca (nesse disco) do trompete em favor do flugelhorn, pavimentando assim importantes estradas.

Na busca por uma nova forma de abordar a harmonia, Davis foi propositalmente atenuando o ritmo e desacelerando o estilo de tocar em uma época onde era crescente o interesse pela arte em geral, se colocando assim na vanguarda do período. E no porão de uma igreja ortodoxa armênia com reverberação de três segundos convertida em estúdio em Nova York, gravou um álbum onde as vozes nunca se erguem e o timbre de cada instrumento é unicamente realçado.

Richard Williams então de modo técnico e extensivo mostra como as cinco peças foram previamente construídas na cabeça de Davis e depois executadas por um timaço que contava com Julian “Cannonball” Adderley no saxofone alto, John Coltrane no saxofone tenor, Bill Evans no piano, Paul Chambers no contrabaixo e Jimmy Cobb na bateria, sendo que em “Freddie Freeloader” é Wynton Kelly quem assume a missão de conduzir o piano durante a faixa.

Usando a palavra “azul” como parâmetro, o autor mergulha bastante em direção a correlações e explicações, o que em parte do livro parece mais um exercício de conhecimento, do que propriamente didático ou narrativo. Organizados como se fossem ensaios, os capítulos se sobressaem em “O Momento Azul”, onde versa sobre o disco em si, “Azul Escuro” onde usa o Velvet Underground como extensão de influência e “Código Azul”, onde faz o mesmo com Brian Eno.

Aliás, na viagem de influências que o autor busca alcançar partindo de “Kind Of Blue” é que a obra fica mais interessante e se descentraliza em uma lista que mesmo sendo diversa, aparece repleta de boas razões para o entendimento. A paixão por Miles Davis fica evidente no texto, o que acaba atrapalhando um pouco e resulta em ligações às vezes imprecisas e outras magistrais como quando utiliza o existencialismo em relação à obra dos cineastas italianos Fellini e Antonioni.

Com um conhecimento evidente sobre o tema, Richard Williams explora a música de “Kind Of Blue” e o poder que este álbum exerceu nas camadas mais profundas da música, baseado em uma ampla lista de referências que demonstra no final. Adotando uma linguagem especializada que às vezes se volta contra si, não se abstêm em traçar seus panoramas usando levemente os mesmos moldes experimentais que esse belo de registro de 1959 se baseou e fez história.

Nota: 7,0

Site oficial sobre o músico: http://www.milesdavis.com

Assista a uma apresentação ao vivo de “So What” que abre o “Kind Of Blue”:

quinta-feira, 10 de maio de 2012

"Inquietos" - 2011


“Two Of Us” dos Beatles toca ao fundo enquanto um jovem vestido de terno passa um giz branco contornando o corpo deitado na rua. A cena exibida sem pressa e que se alonga depois para a cidade faz o espectador se interessar logo de cara e é um bonito gol que o diretor Gus Van Sant marca na entrada de “Inquietos” (‘Restless’, no original). O filme do ano passado ganhou lançamento recentemente em DVD aqui no país.

Gus Van Sant vinha de um bom trabalho anterior (“Milk - A Voz da Igualdade” de 2008) e deixava expectativa para o que apresentaria na sequência. Tipo de diretor que pode facilmente ser tanto amado quanto odiado, preencheu a carreira com películas como “Drugstore Cowboy” de 1989 e “Gênio Indomável” de 1997, porém está devendo há algum tempo algo do mesmo nível (“Elefante” de 2003 é razoável e nada além).

E não é com “Inquietos” que ele paga essa dívida. No longa conhecemos Enoch Brae (o estreante Henry Hopper, filho do ator Dennis Hopper), o rapaz que passa giz em volta do corpo. Estranho e reservado possui como atividade principal frequentar velórios como penetra. Em um desses funerais encontra por acaso Annabel Cotton, a bela e competente Mia Wasikowska do “Alice No País das Maravilhas” de Tim Burton.

O caminho dos dois começa a se cruzar com frequência, seja por sorte ou por causa de uma pequena ajuda das partes, e não demora para que um relacionamento amigável se estabeleça. Os dois carregam dores próprias e uma relação bem particular com a morte e o convívio proporciona uma espécie de alívio para essas dores. E a partir disso que o roteiro de Jason Lew já escancara e anuncia a direção básica pela qual o filme será conduzido.

Nesse escancaramento é que “Inquietos” se perde e não consegue se firmar. Nos primeiros 20, 25 minutos iniciais já dá para desenhar o futuro dos personagens com grande exatidão. Já que a surpresa foi logo descartada do roteiro de opções, a intensidade com que a história se desenvolve passa a ser o principal e nesta, apesar de algumas cenas realmente interessantes, Gus Van Sant também não consegue inserir aquilo que almejava.

“Inquietos” tem uma eficiente trilha sonora nas mãos do grande Danny Elfman e traz nomes como o diretor Ron Howard e a atriz Bryce Dallas Howard na produção, mas é um projeto que fracassa nos seus objetivos. Ao escolher a juventude para tratar de temas complicados como mortalidade e medo, Gus Van Sant não brilha e mergulha o seu mais recente trabalho no abarrotado mar de razoabilidade que se habituou a visitar.

Nota: 5,5

Assista ao trailer:


terça-feira, 8 de maio de 2012

"Not Quite Dead - O Último Show" - Gilbert Shelton


Gilbert Shelton nasceu em 1940 no conservador estado do Texas nos Estados Unidos. No entanto, para o bem dele e dos quadrinhos não herdou quase nada do ranço reacionário que predomina por lá. Pelo contrário, entrou de cabeça na contracultura das décadas citadas e criou os Fabulous Furry Freak Brothers, um trio de hippies loucões que usava para bombardear não só os costumes específicos dessa geração, como também instituições diversas, sem nunca exercer o dom do perdão.

Os seus personagens mais famosos foram os únicos que ganharam edição nacional por aqui em dois livros lançados pela Conrad Editora em 2004 e 2005, que agora também é a responsável por diminuir um pouco essa ausência. Publicado lá fora em 2010, “Not Quite Dead - O Último Show” (“Not Quite Dead: Last Gig in Shnagrlig”, no original) ganha edição nacional com formato de 21 x 27cm e 48 páginas traduzidas por Ludimila Hashimoto. É a estreia dessas figuraças em solo nacional.

A série “Not Quite Dead” deu os primeiros passos em 1992 e de lá para cá estrelou quatro livros, conduzidos do modo calmo e tranquilo do autor. Nela, Gilbert Shelton espelha a “banda de rock menos famosa do mundo”, que é tão desconhecida que nunca chegou a sequer pagar algum imposto e o máximo que consegue é tocar as terças em um bar. O grupo é formado por Cat Wittington, Elephant Fingers, Thor, Sweet Eddie e Felonious Punk, além do faz-tudo Gnarly Charlie.

O álbum que a Conrad apresenta agora pega essa banda recebendo uma notícia fantástica para as suas aspirações: vão realizar um show internacional. Motivados e cheios de esperança, eles não tem conhecimento, no entanto, que são parte de um plano repleto de disparates de um órgão secreto do governo americano para provocar guerra em um longínquo país com o intuito primordial de conquistar pretensos recursos naturais. E claro, precisam de um motivo para tanto.

Com ilustrações do francês Pic, Gilbert Shelton guia a Not Quite Dead em uma trama surreal e repleta de insanidades, onde pelo caminho critica o país onde nasceu (há tempos ele mora na França), assim como condutas políticas e religiosas exercidas por meio do radicalismo. Utilizando a música que sempre esteve presente na sua obra, aplica novamente altas doses de humor na veia do leitor e para não perder o costume, mesmo próximo dos 72 anos, continua não perdoando ninguém.

P.S: Na verdade, não se trata do último show do Not Quite Dead. Em entrevista recente o autor disse que continuará escrevendo sobre os personagens, porém a tradução perdeu um pouco do sentido do título inspirado no filme “O Último Tango Em Paris”.

Nota: 7,0

Mais sobre o autor: http://www.ripoffpress.com

sábado, 5 de maio de 2012

Nada Surf - Hotel Gold Mar, Belém (PA) - 04.05.2012



Passava um pouco da meia-noite e meia quando os norte americanos do Nada Surf subiram ao palco do Hotel Gold Mar em Belém para começar sua apresentação. O sábado de 5 de maio se anunciava ainda preguiçoso nas margens da Baía do Guajará enquanto o público presente escutava os primeiros acordes de “Clear Eye Clouded Mind”, que foi seguida pela melódica “Waiting For Something”, ambas integrantes do novo registro da banda, intitulado “The Stars Are Indifferent to Astronomy”.

Antes de falar sobre o show em si, é bom analisar um pouco o panorama geral do evento. Por diversos motivos, entre os quais distância dos grandes centros e público interessado, Belém sempre fica fora das turnês internacionais que desembarcam no país. Isso até que sofreu algumas mudanças recentes com a passagem por aqui de nomes como Iron Maiden e Deep Purple, além de bons nomes do mercado alternativo como Shout Out Louds e El Cuarteto de Nós, ainda que esses últimos em festivais.

Como show individual, por assim dizer, o Nada Surf talvez fosse a primeira grande aposta, pois apesar dos 20 anos de estrada completados em 2012, a banda sempre ficou no cenário mediano do rock internacional. A aposta do pessoal da SeRasgum então tinha certo grau de risco, visto que o discurso do público da cidade e a sua real participação sempre mantiveram certa distância. Em um local bacana, mas que dificulta um pouco para quem precisa de transporte público, isso agrava-se um pouco mais.

Dentro desse cenário foi satisfatório – pelo menos na concepção visual – a presença do público, que antes do Nada Surf ainda teve exibições do Turbo, Elder Effe e banda e The Baudelaires. O respeito aos horários acabou não me deixando ver os dois primeiros, porém se mostrou como uma das coisas positivas do evento, pois é cultural na cidade o desrespeito quanto a isso. Fica a torcida para que no futuro essa decisão seja mantida, o que servirá indiretamente para uma mudança do próprio mercado.

Colocado o que dispôs-se acima, o show do Nada Surf foi agradável e fez valer a presença. O vocalista e guitarrista Matthew Caws esbanjava simpatia e servia as canções com o auxílio dos velhos parceiros Daniel Lorca (baixo) e Ira Elliot (bateria), além dos convidados Doug Gillard (ex-Guided By Voices) na outra guitarra e Martin Wenk (Calexico) nos teclados. Suando uma barbaridade, falou sobre a felicidade de estar na Amazônia e verteu elogios ao trabalho do Greenpeace (que tinha um barco ancorado na cidade).

Esse envolvimento ambiental, com direito a bandeira de “Desmatamento Zero” no palco, às vezes soou pedante, mas não incomodou tanto quanto o estado de “travamento total” do baixista Daniel Lorca, que foi devidamente comparado por alguns ao Wanderley Andrade, um dos ícones do brega local. O público mais jovem se alternando entre celulares e conversas na frente do palco, igualmente não foi o que se esperava para quem sai de casa para assistir a um show, mas não difere em nada do resto do país. (In)felizes tempos modernos.

Usando bem o novo disco, com direito a boas versões de “Teenage Dreams” e “When I Was Young”, além de sucessos da carreira como “Happy Kid”, “Always Love” e “Popular”, sem contar com a porrada de “Blankest Year” usada para terminar tudo, o Nada Surf fez um show pulsante e agregou um público, que de certo modo, é muito carente por eventos do tipo. Bastou sorrisos, simplicidade e canções para serem cantadas de pulmões abertos, para deixar a mangueirosa de bem com a vida. Não foi espetacular ou sensacional, mas afinal de contas o que hoje em dia pode ser classificado assim? 



P.S: As fotos são do site da produtora. Mais aqui: http://www.flickr.com/photos/serasgum

Leia uma entrevista bem bacana com a banda falando sobre a turnê brasileira e outras coisas mais, aqui: http://screamyell.com.br/site/2012/04/27/entrevista-nada-surf

quinta-feira, 3 de maio de 2012

"Blues Funeral" - Mark Lanegan Band - 2012


Nos sete minutos e sete segundos da faixa que encerra o álbum “Blues Funeral”, Mark Lanegan apresenta angústia e um leve desespero nos versos que conduz sobre uma base quebrada e de clima carregado. Nas frases da canção rasga revistas e livros, mantêm a mágoa por perto e tenta extrair alguma verdade dos fatos em sua volta. É difícil para ele assumir o que quer que tenha feito, apesar de saber que não tem mais volta. “Tiny Grain Of Truth” é a última dose servida em uma noite repleta de incertezas.

“Blues Funeral” é o sétimo disco solo do ex-Screaming Trees e exibe no conteúdo a mesma carga intensa que permeou não somente os tempos com a ótima banda de Seattle, como também os projetos com o Queens Of The Stone Age, Isobel Campbell, Soulsavers e Gutter Twins. Lançado com o nome de Mark Lanegan Band (que não utilizava desde “Bebblegum” de 2004) é o primeiro pelo selo 4AD, casa onde nomes como Bon Iver, Tv On The Radio, Pixies e Cocteau Twins já passaram ou ainda habitam.

Produzido pelo amigo Alain Johannes (Eleven, Them Crooked Vultures) e com participações de outros como Jack Irons, Greg Dulli e Josh Homme, o músico optou em mudar a forma com que exibia suas canções. O novo trabalho esquece os violões tão utilizados em outrora e resume as guitarras a coadjuvantes (ainda que fundamentais), deixando a linha de frente ocupada por sintetizadores e programações eletrônicas, rememorando assim a música mais soturna que o pós-punk dos anos 80 (Joy Division e afins) produziu.

“The Gravedigger's Song” usa inglês e francês para falar de um amor que serve como alívio, enquanto “Bleeding Muddy Waters” homenageia o bluesman e faz Lanegan sentir e sangrar. “St. Louis Elegy” emerge com morte e religião e “Riot In My House” é um dos raros rocks do disco (o outro é “Quiver Syndrome”), com guitarras gritando ao fundo do caos e tumulto citados na letra. Em “Ode To Sad Disco” temos um dance que foi deposto do seu lugar e “Phantasmagoria Blues” se assemelha mais com as coisas antigas.

Esse novo registro mostra um artista que apesar dos anos de carreira, ainda se mostra interessado em confrontar a si mesmo. Pode-se até dizer que os assuntos são repetitivos, porém a vida sempre será rica em dores, sofrimentos e aflição. Da sua geração, Mark Lanegan é aquele que mais sabe criar em cima desses temas. Essa habilidade (boa ou má, quem saberá dizer?) continua a gerar uma obra que foge da obviedade e serve como ferramenta para acalmar as próprias inquietudes. “Blues Funeral” é o mais recente exemplo disso.

Nota: 7,5

Site oficial: http://marklanegan.com

Textos relacionados no blog:


Assista a uma apresentação ao vivo com 4 músicas do álbum com outra pegada: